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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

semana, 1.195 mortes: o retrato da violência no Brasil

Mil, cento e noventa e cinco mortes violentas. Uma média de uma a cada oito minutos no país. Durante uma semana, o G1 registrou todas as vítimas de um embate silencioso. São crimes que, na maioria das vezes, ficam esquecidos – casos de homicídios, latrocínios, feminicídios, mortes por intervenção policial e suicídios espalhados pelo Brasil.
Há inúmeros exemplos: de como uma vida pode custar apenas R$ 20, de como uma discussão de casal pode terminar em tragédia, de como uma execução pode parecer algo banal. 
O trabalho é o ponto de partida de uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP e com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O projeto tem um nome: Monitor da Violência. 
O QUE PODE SER FEITO PARA ENFRENTAR A EPIDEMIA DE MORTES:diretores do FBSP analisam 

Nesta primeira etapa, 230 jornalistas do G1 espalhados pelo país apuraram e escreveram as histórias dos 1.195 mortos em 546 cidades – quase 10% do total de municípios brasileiros. São todos os casos de morte de que se tem notícia registrados no período de 21 a 27 de agosto. 

Trata-se de uma pequena amostra – se comparada à marca de quase 60 mil homicídios anuais –, mas que perfaz um retrato da violência no Brasil. 

Alguns recortes se destacam no levantamento feito. São eles: 
Do total de vítimas, 89% são homens 
Os jovens – especialmente os de 18 a 25 anos – são a faixa etária mais vulnerável à violência (33% do total) 

Negros correspondem a 2/3 das vítimas em que a etnia é informada 
A maior parte dos crimes ocorre à noite (35%) 
O fim de semana concentra um grande percentual dos casos (36%) 
81% morrem vítimas de arma de fogo (quando a arma é informada) 
Em 15% dos casos, o autor do crime conhece a vítima 
São 89 suicídios no período 
Mas mais importante que os números em si são as histórias dessas vítimas: saber quem são, por que entraram para o rol de mortos e o que representam em meio a essa epidemia de violência que vive o país. 
Vidas que custam menos de R$ 100 
Manoel Pereira da Silva teve a vida interrompida aos 63 anos após receber uma facada no pescoço em João Pessoa. O motivo: uma dívida de R$ 20. 
Dependente químico, ele foi abordado pelo agressor, que cobrou o dinheiro, em uma região conhecida como Cracolândia. Uma mulher ainda tentou intervir. Acabou ferida e não conseguiu evitar a morte do idoso. 
Não foi um caso isolado na semana. No Pará, um homem de 48 anos foi assassinado por conta de uma dívida de R$ 50. Foi esfaqueado e deixado caído no meio da rua em Tucuruí. 
No Gama, cidade-satélite do Distrito Federal, um outro acerto de contas. Um adolescente de 16 anos foi assassinado a sangue frio porque tinha uma dívida de R$ 80 relacionada a drogas. Um fim abreviado para um jovem considerado “brincalhão e de bom relacionamento” pelos colegas da escola, que ele havia largado um ano antes. 
De bebê a centenário 
Entre as vítimas há desde um bebê de apenas 2 meses até um homem de 112 anos. No caso do menino João Myguel Vicente Gomes, a morte ainda é investigada. Ele foi levado a um hospital no Agreste de Pernambuco já sem vida. E entrou para a triste estatística da semana.
Em outro ponto do estado, dois dias depois, era registrada a morte do mais velho da lista. Eriberto Francisco de Lima, de 112 anos, foi morto em uma área de mata de Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife. Ele foi encontrado enforcado, mas a família não acredita em suicídio e faz um apelo para que as autoridades investiguem o caso. 
Apenas duas capitais não registraram mortes violentas durante a semana em questão: Vitória e Campo Grande. Florianópolis só aparece na estatística pois teve um suicídio no período. 
Por outro lado, mais de 45 cidades registraram índice superior a 10 mortes a cada 100 mil habitantes – índice considerado extremamente alto se for levado em conta o período de apenas sete dias analisados (já que a taxa é usada como parâmetro anual). 
O Ceará foi o recordista de casos em números absolutos: 128 mortes – quase uma por hora. 
Mulheres como alvo 
Apesar de os homens serem maioria entre as vítimas, o número de mulheres assassinadas – especialmente pelos companheiros ou ex-companheiros – também chama a atenção. É um dado que só cresce. Ainda assim, poucos casos são classificados como feminicídios, o que denota uma subnotificação nos registros deste tipo de crime. 
Segundo o levantamento, são nove vítimas. Umas delas, Laniele Santos Duques da Silva, foi morta com um tiro na cabeça pelo marido em Mauá, na Grande São Paulo, e deixou uma filha de 1 ano. 
Em Tupã (SP), Jaguarari (BA), Icó (CE) e Serra (ES), as vítimas foram alvo de ex-companheiros. Débora Goulart, que já havia registrado um boletim de ocorrência contra o ex-marido, foi esfaqueada dentro de casa no interior de São Paulo. Na Bahia, Graciela de Souza Dias foi morta a pauladas pelo ex, que não se conformava com o fim do relacionamento. O mesmo ocorreu no Ceará com Patrícia Ferreira da Silva, morta a tiros pelo ex-companheiro, que dizia não ter “superado” a separação. No Espírito Santo, Gabriela Silva de Jesus foi estrangulada pelo ex-noivo. 
Sancionada há pouco mais de dois anos, a Lei do Feminicídio aumenta a pena para assassinatos contra mulheres cometidos em razão do gênero. Mas ainda é pouco aplicada. 
Falta de transparência 
Outro problema verificado no levantamento diz respeito à transparência. Boa parte das mortes, por exemplo, só foi registrada pelas equipes do G1 após a semana analisada. Isso porque vários casos foram conhecidos dias depois, quando os órgãos de segurança divulgaram seus balanços mensais. 
Várias secretarias, porém, se negaram, tanto durante a semana como posteriormente, a passar uma listagem das vítimas ou mesmo um dado consolidado. 
O G1, então, fez um cruzamento com fontes, policiais, sindicatos e com IMLs (Institutos de Medicina Legal) para chegar ao número final e contar todas as histórias. 
O trabalho mostra a falta de transparência de muitos governos estaduais. Mas não só: revela também uma total ausência de padronização e de um sistema nacional que abranja homicídios e demais mortes violentas. 
Um exemplo da dificuldade em obter estatísticas confiáveis são os casos de mortes por policiais. Em alguns estados, eles entram na estatística como homicídios. Em outros, são separados e constam como “confronto com a polícia”, “auto de resistência” ou outra denominação diferente. O G1 teve de analisar caso a caso para chegar ao número de 61 mortes por intervenção policial no período (ainda assim, é possível que algum caso, em razão de informações escassas por parte das forças de segurança, não tenha entrado na conta).

 

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